Os Guarda-Chuvas do Amor (1964)

Os Guarda-Chuvas do Amor (Les Parapluies de Cherbourg)
França, 1964, 35mm, 90 min
Diretor e roteiro: Jacques Demy
Com Catherine Deneuve, Nino Castelnuovo, Anne Vernon, Marc Michel

Sinopse

Cherbourg, 1957. Guy Foucher (Nino Castelnuovo) é um jovem de 20 anos que foi criado pela madrinha e trabalha como mecânico de carros. Ele é apaixonado por Geneviève Emery (Catherine Deneuve), uma adolescente de 17 anos que ajuda sua mãe viúva no negócio da família, uma loja de guarda-chuvas elegante, mas pouco lucrativa. Geneviève também o ama, mas sua mãe acha que ela é muito nova para casar e não vê como Guy pode manter uma família. Ele é convocado para o serviço militar e ela descobre estar grávida. Surge o dilema: esperar o retorno do amado ou seguir adiante?

O cinema “em cantado” de Jacques Demy

A última vez que assisti ao filme Os Guarda-Chuvas do Amor, de Jacques Demy, foi em 2012, no Festival de Cannes, que possui um programa especial dedicado aos clássicos restaurados. A exibição foi perfeita. Imagem e som irretocáveis. Nesse mesmo festival, em 1964, Os Guarda-Chuvas do Amor recebeu a Palma de Ouro de melhor filme. Na disputa pelo prêmio, entre outros, estava Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha. O filme de Demy também foi nomeado ao Oscar nas categorias de Melhor Canção Original, Melhor Banda Sonora Original (Michel Legrand) e Melhor Argumento escrito para cinema.

Os Guarda-Chuvas do Amor narra uma história de amor em cores vibrantes, mas sem final feliz. A doce Geneviève Emery (Catherine Deneuve) trabalha na loja da mãe (Anne Vernon), onde são vendidos elegantes guarda-chuvas. Ela está noiva de Guy Foucher (Nino Castelnuovo), que trabalha como mecânico em uma oficina de carros. Eles vivem a intensidade do amor de juventude. Apaixonados, prometem amor eterno, mas a relação entre eles não é vista com bons olhos pela mãe da garota, que não considera Guy um bom partido para a sua bela e única filha.
O jovem é convocado para a Guerra da Argélia. Acontecimento que marca a separação do casal. Antes da partida, uma noite de amor. Geneviève engravida e vive o dilema de esperar o retorno do amado ou, pressionada pela mãe, aceitar a proposta de casamento de Roland Cassard (Marc Michel), um homem bem de vida, dono de uma loja de jóias, que promete cuidar de seu filho. A seqüência final é de uma melancolia profunda. A realidade se impõe. O amor sonhado e idealizado é confrontado com o amor real, o amor possível.  Embora celebre o amor, Demy sabe dos obstáculos que muitas vezes impedem a sua concretização.
Uma particularidade de Os Guarda-Chuvas do Amor é que as falas são inteiramente cantadas pelos personagens, ao ritmo dos belos arranjos de Michel Legrand. Característica que faz com que a célebre obra do cineasta francês se aproxime de uma ópera. O artifício valoriza tanto os momentos alegres vividos pelos personagens como os dolorosos, quando eles entendem a impermanência da felicidade e a discrepância entre sonho e realidade. Ao encenar a leveza, Jacques Demy não deixa de lado a dureza da vida, os desencontros, a realidade. Em seus filmes, a realidade está sempre em descompasso com a fantasia idealizada.

Jacques Demy e a Nouvelle Vague

Os Guarda-Chuvas do Amor foi lançado em 1964 mas não se encaixa na chamadaNouvelle Vague, movimento vanguardista que explode na França nos anos 60 e que marca a história do cinema. Demy é criticado por seus contemporâneos, cineastas identificados com a Nouvelle Vague, seja por seus temas considerados supérfluos, artificiais, ideologicamente vazios, seja pela sua identificação com o cinema clássico norte-americano, em especial os musicais. Mas Demy faz o que lhe interessa, volta-se para o sonho, a fantasia e faz um cinema que foi chamado de “en chanté” (trocadilho com cantar e encantar).

Demy e Varda

Jacques Demy foi casado por mais de três décadas com Agnès Varda, cineasta francesa bem aceita pela Nouvelle Vague e considerada uma das precursoras do movimento. Com Varda, Demy teve dois filhos. Ficaram juntos até a morte do diretor, em 1990. Eles nunca co-dirigiram um filme, não compartilhavam a mesma equipe de trabalho, embora sempre participassem da etapa de pós-produção do filme do outro. Sobre Demy, Varda fez três filmes, três declarações de amor: Jacquot de Nantes (1991), onde a cineasta filma o mais próximo possível o corpo moribundo de seu marido, em seus momentos finais de vida, As Garotas Românticas Fazem 25 Anos (1993) e O Universo de Jacques Demy (1995). Ela também se dedicou a restaurar a obra completa do cineasta.

 Por Marília Hughes